Plano de saúde deve cobrir Equoterapia como método de tratamento do Transtorno do Espectro Autista (TEA)
A equoterapia, definida como método terapêutico pela Lei 13.830/2019, surge como uma abordagem interdisciplinar que utiliza o cavalo no tratamento de pessoas com deficiência, incluindo autismo. Reconhecida pelos seus benefícios biopsicossociais, fortalece a musculatura, estimula a interação social e promove o desenvolvimento emocional. A Lei nº 14.454/2022 e a Resolução Normativa ANS nº 539 reforçam a obrigatoriedade de sua cobertura, evidenciando seu papel vital no tratamento do autismo.
Introdução
A equoterapia é uma modalidade terapêutica que se destaca como uma ferramenta eficaz no tratamento do autismo. Utilizando o cavalo como parte integrante do processo terapêutico, a equoterapia oferece uma abordagem interdisciplinar que visa ao desenvolvimento biopsicossocial de pessoas com autismo. Essa forma de terapia tem ganhado reconhecimento devido aos seus consideráveis benefícios, que vão desde o fortalecimento muscular até o estímulo sensorial e emocional proporcionado pelo contato com os cavalos.
A Lei 13.830/2019 define a equoterapia como: “método de reabilitação que utiliza o cavalo em abordagem interdisciplinar nas áreas de saúde, educação e equitação externa ao desenvolvimento biopsicossocial da pessoa com deficiência ”. Trata-se, portanto, de um método terapêutico por expressa disposição legal.
Para crianças com autismo, a equoterapia pode desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento de habilidades sociais, emocionais e físicas.
O contato com os cavalos estimula a comunicação não verbal, promove a interação social e ajuda na regulação emocional, aspectos muitas vezes vezes para pessoas dentro do espectro autista. Além disso, o movimento tridimensional do cavalo oferece estímulos sensoriais que podem ajudar a melhorar a coordenação motora e o equilíbrio das crianças autistas.
Outro aspecto importante da equoterapia é o vínculo que se estabelece entre o paciente e o animal.
Os cavalos, por sua natureza tranquila e receptiva, proporcionam um ambiente seguro e acolhedor para as crianças, permitindo que elas desenvolvam confiança e autoestima. Esse tratamento pode se estender para além das sessões de equoterapia, influenciando positivamente o comportamento e a atitude das crianças em outras áreas da vida.
Como se percebe, são consideráveis os benefícios.
Contudo, diversos planos de saúde têm negada a cobertura ao tratamento, sob a justificativa de que o procedimento não constava no rol obrigatório da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS.
Na verdade, essa negativa se dá devido ao alto custo do tratamento, o qual é contínuo e por tempo indeterminado.
Os planos de saúde são obrigados a cuidar do tratamento com o emprego da equoterapia?
Apesar da recalcitrância das operadoras de planos de saúde, atualmente não há mais discussão, os planos de saúde são sim obrigados a equoterapia empregada no tratamento do TEA.
Como amplamente noticiado nas mídias sociais, em junho de 2022, o STJ, com vistas a dar uma solução à controvérsia, em decisão bastante polêmica, decidiu que o papel de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, tributário, o que teve como principal efeito prático a exclusão da cobertura de métodos empregados no tratamento de pessoas autistas.
Contudo, depois de uma grande repercussão social e mobilização popular, o Congresso Nacional editou a Lei nº 14.454/2022, que buscou superar o entendimento firmado pelo STJ, a qual passou a prever, de maneira expressa, o caráter exemplificativo do papel da ANS.
A Lei n. 14.454/2022, publicada no dia 22/09/2022, a qual entre outras medidas acrescentadas os §§ 12 e 13 do artigo 10 da Lei n. 9.656/1998, com a seguinte redação:
"Arte. 10(...) § 12. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado pela ANS a cada nova incorporação, constitui uma referência básica para os planos privados de assistência à saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 e para os contratos adaptados a esta Lei e fixam as diretrizes de atenção à saúde.
§ 13. Em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não contenha disposições previstas no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que:
I - existe comprovação de eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou
II - existem recomendações da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou existe recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovados também para seus nacionais.”
Na prática, o novo texto da lei definia que o plano de saúde deve autorizar a cobertura de tratamentos ou procedimentos não contemplados no Rol da ANS.
É evidente que as normas que restringem a cobertura das operadoras de planos de saúde têm como objetivo principal harmonizar a relação contratual, garantindo segurança, eficácia e equilíbrio, a fim de preservar a supervisão do sistema de saúde suplementar.
Essas normas protegem os interesses dos usuários, ampliando a cobertura em relação a doenças. Ao mesmo tempo, também protegem os interesses das operadoras ao estabelecer antecipadamente os procedimentos que elas são obrigadas a custear, permitindo uma previsão das despesas a serem realizadas e garantindo a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, independentemente de existirem ou não especificamente lucrativos.
Em conformidade com tais princípios e com o intuito de resolver a disputa sobre os tratamentos recomendados para as pessoas entregues com Transtorno do Espectro Autista - TEA, a agência reguladora emitiu a Resolução Normativa ANS nº 539, datada de 23 de junho de 2022, para modificar a Resolução Normativa nº 465, de 24 de fevereiro de 2021, que trata do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde na esfera da Saúde Suplementar:
"Arte. 3º O art. 6º, da RN nº 465, de 2021, passa a vigorar acrescido do § 4º, com a seguinte redação:
"Art. 6º (...) § 4º Para a cobertura dos procedimentos que envolvem o tratamento/manejo dos beneficiários de portadores de transtornos globais do desenvolvimento, incluindo o transtorno da espectro autista, a operadora deverá oferecer atendimento ao prestador para a execução do método ou técnica indicada pelo médico assistente
para tratar a doença ou agravo do paciente."
O objetivo dessa ação foi regular a cobertura obrigatória de sessões com psicólogos, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos para o tratamento/gestão dos beneficiários identificados com TEA e outros transtornos globais do desenvolvimento.
O Comunicado nº 95 de 23/6/2022, da ANS recomendou o seguinte " todas as operadoras de planos de saúde que por determinação judicial ou mera liberalidade, dentre outras hipóteses, já estejam atendendo aos portadores do transtorno da espectro autista e todos os beneficiários divulgados com CIDs que se referem aos Transtornos Globais do Desenvolvimento (CID-10 - F84) em determinada técnica/método/abordagem indicada pelo médico assistente, reconhecidos nacionalmente, tal como a ABA (Análise Aplicada do Comportamento), não poderão suspender o tratamento , sob pena de vir a configurar negativa de cobertura " (em https://www.gov.br/ans/pt-br/assuntos/noticias/operadoras/ans-divulga-comunicado-no-95, acesso em 4/7 /2022).
Além disso, a indevida negativa pela operadora à implementação da terapia prescrita equoterapia, sem justificativa adequada, diante da necessidade de implementação precoce de tratamentos que auxiliem no seu desenvolvimento, pode ensejar a indenização por danos morais.
Assim, de acordo com a alteração legislativa e a atual lista de procedimentos da ANS, é obrigatório o custeio/cobertura do tratamento de equoterapia desde que prescrito pelo médico do paciente.
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